LONDRINA 85 ANOS

trans1a28a1-1575564037-85.jpg

Sobrevoo por Londrina

No início a mata cobria tudo o que se via no horizonte. Aliás, a contemplação do alto da vastidão das terras à oeste do rio Tibagi era privilégio quase que exclusivo dos pássaros. Ao contrário da topografia do Norte Pioneiro, o relevo do então sertão a ser desbravado era menos acidentado. Mas não demoraria muito para que toda a beleza desenhada nas pranchetas da Companhia de Terras pudesse ser admirada de cima.

CAPA Tatiana Galindo especial para a Folha

Em pouco tempo, as trilhas caingangues próximas ao Ribeirão Três Bocas deram lugar às estradas e à ferrovia. No lugar dos ranchos de palmito, ergueram-se modernos edifícios. Os céus passaram a ser tomados pelo vai e vem dos aviões. Um grande centro nascia em meio a um mar de cafezais, ora verdinhos, ora floridos, e até mesmo queimados pelas geadas. Era a visão que impressionava quem pousava na cidade que chegou a ser o destino aéreo do interior do País com o maior número de voos diários.

Gráfico sobre ilustração de Odil Miranda Ribeiro  @odilmirandaribeiro (Especial para a Folha)
Gráfico sobre ilustração de Odil Miranda Ribeiro  @odilmirandaribeiro (Especial para a Folha)

Um moderno traçado urbanístico é criado no que hoje conhecemos como o Centro Histórico. A sede da paróquia, que nos anos 1950 é elevada à diocese e, atualmente a Catedral Metropolitana, é estrategicamente colocada em meio a um “grão de café”. Com o passar do tempo, inúmeros projetos arquitetônicos vão se espalhando pela cidade e enfeitando a bela Londrina.

Na comemoração dos 85 anos do município, a FOLHA convida o leitor a uma viagem aérea, com paradas em sete maravilhas da cidade, escolhidas por meio de consulta em nosso site. Sem precisar fazer check-in ou passar pelo raio-x, você é nosso convidado para esta viagem que terá como ponto alto o Lago Igapó, destino eleito como o preferido por 47,4% dos internautas que responderam nossa pesquisa.

A viagem prossegue com escalas no Centro Histórico, Estádio do Café, Rodoviária, Universidade Estadual de Londrina, Gleba Palhano, além de sobrevoos sobre pontos como a Avenida Saul Elkind. Além de contemplar toda a beleza em imagens e vídeos, você vai poder acompanhar nas reportagens histórias de pessoas que vivem esses lugares. Pronto para decolar?

Isaac Fontana (Framephoto/Estadão Conteúdo)
Isaac Fontana (Framephoto/Estadão Conteúdo)

Lago Igapó, um marco afetivo

GUILHERME MARCONI

Reportagem local 

***

“Antevi a paisagem com olhos de poeta. Não avancei, não me atrevi a fitá-la com olhos de sociólogo. Pensei apenas no encanto daqueles que amam a beleza, daqueles que buscam inspiração num pôr de sol, numa noite de lua cheia, numa manhã brilhante de luz. Não pensei no povo (…) que aqui se iguala e se confunde e que, desconhecendo discriminações de raça e de fortuna, para aqui convergiu certo e que este logradouro, feito com dinheiro de todos, é patrimônio comum.”

Francisco Pereira de Almeida Júnior, autor do hino de Londrina.  O poema foi lido na inauguração do Lago Igapó, em 1959

***

Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)
Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)

A FOLHA foi ao Lago Igapó mostrar que apesar de passados 60 anos, o poema escrito por Francisco Pereira de Almeida Júnior, no jubileu de prata de Londrina, permanece atemporal.  A antigo ribeirão transformado em lago que marca a paisagem urbana de Londrina é até hoje um espaço diverso, democrático que inspira pessoas e transforma a cidade num local aprazível.  Embora não seja patrimônio tombado, o Lago Igapó é patrimônio natural e cultural da cidade. Une as pessoas pelo laço afetivo.

Anderson Coelho (Arquivo Folha)
Anderson Coelho (Arquivo Folha)

Não à toa, o cartão postal de Londrina – que ganhou luzes e cores nestes 85 anos – foi o ícone mais lembrado por aqueles utilizam sempre o espaço e até mesmo a aqueles que não o fazem usualmente.   Construído pelos pioneiros, com o represamento de rios, o Lago Igapó, na língua tupi, significa área alagada pelo trasbordo de rio.  E até hoje transborda alegria e boas histórias.  

Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)
Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)

Para Wanda de Moraes, presidente do Compac (Conselho municipal de preservação do patrimônio cultural), o Lago Igapó acaba se sobressaindo mesmo numa cidade cortada por inúmeros fundo de vale, com parques, matas, o bosque, entre outros prédios históricos “principalmente pela interação que permite e pela beleza cênica.” Segundo ela, a valorização do lago pelos londrinenses é justamente provocada porque o espaço é ocupado, o que permite esse olhar mais zeloso dos cidadãos. “ Temos uma máxima no patrimônio que é: a população preserva aquilo que lhe é caro”.

Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)
Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)

A arquiteta Camila Forbeck também destaca o lado afetivo, a sensação de pertencimento que o lago provoca aos londrinenses.   “As cidades nasceram como meio de troca de mercadorias. E hoje vivemos e necessitamos de outros tipos de trocas de experiências, de convivência. E ter uma paisagem como está à disposição dos cidadãos, notadamente melhora a qualidade de vida.”  

Luis Fernando Wiltemburg
Luis Fernando Wiltemburg

Bisneta do autor do hino da cidade e do poeta, Camila cobra que o espaço seja cuidado pelas autoridades, principalmente na melhora da iluminação pública para garantir segurança aos usuários do lago.  Com a mesma inspiração do seu ascendente, a arquiteta destaca o laço afetivo do espaço.  “Quando eu reli essa descrição dele, eu me identifiquei na mesma hora. Porque a cidade é nossa, ela nos une.” Ele destacou essa questão de ter um ambiente democrático. “Os poetas têm isso dentro deles, o bem-estar é atemporal”.  

Patrícia Maria Alves
Patrícia Maria Alves

Do nascer ao pôr do sol, lago virou rota de corredores   

O londrinense “sessentão” ainda tem muito pique. É no Lago Igapó, ao nascer ou pôr do sol, que dezenas de grupos de corrida, de ciclistas, de jogadores vôlei de areia, e até de rugby e do moderno “cross fit” escolheram para movimentar o corpo ao ar livre.   O espaço democrático inspira jovens e idosos. É caso da paulistana Luci Tsuruko Nakau, 63 anos, que as cinco da manhã já está de pé, para correr e acompanhar o nascer do sol refletido no lago. “Eu sou de São Paulo e vim para cá porque aqui qualidade de vida é outra. Aqui é arborizado e o verde estimula. Corro há três anos e eu não perdi o pique. O Lago é ‘top’, sinto a presença da Deus aqui.” diz entusiasmada.   

Gustavo Carneiro
Gustavo Carneiro

A prática da corrida ao redor do Lago mudou a rotina do casal Lilian Cristina Ribeiro e André Luís Matos. “Quando não corremos, o nosso dia já começa diferente. A corrida nos faz mais calmos, mais serenos e até mesmo mais focado no trabalho”, diz Matos. Lilian destaca que a prática ao redor do lago “tira o estresse, melhora o humor, é necessária, é vital.”  Os corredores madrugueiros ainda destacam o valor das amizades, dessa troca. “Conhecemos pessoas do bem, caridosas, dedicadas, a corrida transforma o caráter, e com um visual destes fica tudo mais bonito.”  

O educador físico, Ricardo Monson, revela que ao montar os treinos do grupo de corrida Carpe Diem, o lago sempre aparece no itinerário. Isso porque principalmente no horário de “rush”, as pistas do Lago Igapó 2 com 2,3 km, e do Lago 1 com 2 km de extensão permitem a corrida sem traspor ruas. “Londrina, proporcionalmente é uma das cidades com mais praticantes de atividades ao ar livre do Brasil, se compara com cidades litorâneas como Florianópolis. As pessoas se sentem estimuladas aqui, mesmo não sendo litorânea, tem esse charme.”  

Entretanto, mesmo os praticantes mais entusiasmados cobram melhorias principalmente na iluminação das pistas internas de pedrisco. “Melhorando as pistas internas sobrará mais espaço na pista externa que atualmente acaba congestionada pela quantidade de ciclistas e pedestres que acabam disputando espaço nos horários de pico.” disse Monson.

Isaac Fontana (Framephoto/Estadão Conteúdo)
Isaac Fontana (Framephoto/Estadão Conteúdo)

Ao luar, mulheres remam inspiradas no Igapó   

Não era noite de lua cheia como antevia o poeta, mas foi numa noite de quarto minguante com reforço das luminárias e decoração de natal, que um grupo de mulheres remou pela vez à noite no Lago Igapó 1. Uma embarcação inusitada chamada de Dragon Boat – de origem chinesa, com 13 metros de comprimento e com capacidade de 22 pessoas – percorreu o lago carregado de boas histórias e de benefícios que a atividade proporciona.

Patrícia Maria Alves
Patrícia Maria Alves

A experiência de remar ao luar no Igapó e mais uma etapa que tem transformado a vida, de Sueli Sardi que começou a treinar a poucos meses. A servidora pública aposentada assim como as outras mulheres do grupo venceram o câncer de mama e iniciaram juntas na remada cujos benefícios ajudam a minimizar a reincidência da doença em virtude da resistência física e a melhora do sistema imunológico. “Nós temos um objetivo para corrigir um problema físico, mas também para se animar… curtir esse esporte ao ar livre. O lago é lindo e nos inspira”.

Maria Montes, coordenadora do projeto Carinho, Amor e Vida às Mulheres ao Câncer, destaca ainda que atividades como esta precisam ser estimuladas. “ A gente tem convidado as pessoas, todos estão amando e não conheciam. É gostoso e saudável ainda mais no nosso cartão postal. Ainda queremos programar mais remadas noturnas”.  

Isaac Fontana (Framephoto/Estadão Conteúdo)
Isaac Fontana (Framephoto/Estadão Conteúdo)

Para o técnico do Iate Clube, Gelson Moreira da Silva , o Igapó ainda subutilizado para a prática de atividades náuticas. A ideia é transforma Londrina capital brasileira do dragon boats e estimular outras competições de caiaque e remo, proporcionando mais um atrativo turístico à cidade. “O Lago Igapó é uma preciosidade, infelizmente ele não é aproveitado como deveria. Podemos potencializar as atividades náuticas aqui em mais de 90%. Como muitas atividades e campeonatos e claro que o local precisa ser mais cuidado, principalmente o poder público precisa minimizar o assoreamento nos dias de chuva.” alerta.

Centro Histórico em um grão de café

Isaac Fontana (Framephoto/Estadão Conteúdo)
Isaac Fontana (Framephoto/Estadão Conteúdo)

LAIS TAINE

Reportagem local

O grão que elevou a cidade à capital mundial do café não se limita aos fatos históricos, ele está na arte, na economia, na arquitetura e também nos mitos. Entre tantas narrativas que se criam em torno de uma cidade, Londrina tem uma curiosa: a de que nasceu dentro de um grão de café. Vista do alto, a lenda aparece para aqueles que não dispensam um bom enredo, de lá se vê um desenho no mapa que representaria o grão da germinação de uma cidade.

Bem no Centro da cidade, a forma oval que vai da rua João Cândido até Senador Souza Naves entre avenida Paraná e rua Piauí cerca pontos históricos da cidade tendo como núcleo a Catedral. São seis quadras cortadas pelas alamedas Manoel Ribas e Miguel Blasi, que formariam o vinco característico do grão de café. Uma elipse em meio a tantos quadrados dá o destaque da figura, localizada no ponto mais alto de Londrina.

Isaac Fontana (Framephoto/Estadão Conteúdo)
Isaac Fontana (Framephoto/Estadão Conteúdo)

Os detalhes foram projetados pelo topógrafo russo Alexandre Razgulaeff, em 1932. A primeira planta urbana da cidade, conhecida por Planta Azul, demonstrava uma cidade-jardim idealizada, que 40 anos depois recebeu críticas do próprio criador. “A cidade é mal projetada, mas não por minha culpa”, disse o topógrafo referindo-se ao projeto inicial que previa 30 metros de largura para avenidas e 24 metros para as ruas, medidas que a Inglaterra mandou reduzir para 12 metros.

Ricardo Becari (Especial para a Folha)
Ricardo Becari (Especial para a Folha)

As informações são do livro Labirinto de Imagens: paisagens de Londrina, de Humberto Yamaki. O pesquisador tem várias publicações sobre o planejamento urbano da cidade e afirma que o desenho do grão de café no mapa não se trata de uma característica planejada. “São lendas e mitos de frentes de colonização”, afirma em resposta à reportagem.

Arquivo Museu Histórico de Londrina
Arquivo Museu Histórico de Londrina

Yamaki considera que o grão de café não existe. “Razgulaeff projetou Londrina num ‘alto’ identificado por Macdonald e atravessado por uma picada antiga transformada em Estrada de Autos. Razgulaeff procurava em seus projetos (Heimtal, anterior a 1929) e Londrina (1932) incorporar as condicionantes tais como: picadas e ferrovias. Além disso verificar a questão do relevo, águas, etc.”.

IPPUL
IPPUL

Como exemplo, conta que a praça central do pioneiro patrimônio Heimtal, projetada pelo mesmo topógrafo, também é circular. “O que não significa que represente alguma semente ou grão”, argumenta. Para o pesquisador, há outros mitos e lendas da cidade que permeiam as frentes de colonização. “Grão de café, praça em forma de bandeira inglesa, pequena Londres…”, enumera. Portanto, Yamaki ressalta a importância da divulgação das pesquisas que se baseiam em análise sistemática e de interpretação de plantas e mapas.

Por dentro da lenda

Mesmo assim, apreciadores de boas histórias não deixarão de associar a elipse central ao grão. Independentemente do que se vê, o local guarda boa parte dos passos iniciais da cidade. São memórias registradas nesses quarteirões de uma Londrina movimentada pela cultura, quando artistas famosos se hospedavam no Hotel Bourbon e faziam suas refeições no Restaurante Rodeio. Os dois ainda estão em pé para contar o que viram e ouviram aquelas paredes.

Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)
Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)

Diferente da Casa de Chá Fuganti, situada na outra ponta para receber a alta sociedade e movimentar o outro lado do desenho. O comércio não resistiu, mas o prédio, firme no seu objetivo, continua roubando atenção, sobretudo nos eventos natalinos.

Gustavo Carneiro
Gustavo Carneiro

Numa espécie de autorreferência, dentro do “grão” há uma obra de arte em homenagem a essa cultura e imigração. “Cafés e Etnias”, de Poty Lazzarotto, está exposta na agência da Caixa Econômica Federal, na rua Rio de Janeiro.

Basta atravessar a rua para se deparar com o quarteirão das artes, ou quadra 33, que no seu formato triangular forma um dos lados em semi-círculo da elipse. Ela foi projetada para abrigar prédios públicos, o que até hoje ocorre em boa parte dela, com as estruturas da Biblioteca Pública Municipal, onde ficava o Fórum, Secretaria Municipal de Cultura, na antiga Casa da Criança, e Centro de Saúde.

Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)
Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)

Em um dos lados do núcleo do desenho está o Bosque Marechal Cândido Rondon, principal área verde do centro da cidade, espaço que acolheu o terminal urbano de transporte coletivo até 1978 e depois ganhou o Zerinho como área de lazer existente até hoje.  

Isaac Fontana (Framephoto/Estadão Conteúdo)
Isaac Fontana (Framephoto/Estadão Conteúdo)

Do outro, a Praça Marechal Floriano Peixoto, mais conhecida como Praça da Bandeira. Além de ser responsável pelos eventos nacionalistas que exigiam içar a bandeira do Brasil no mastro localizado no centro da praça, há quem prefira outra narrativa: a de que a praça foi construída em homenagem à bandeira do Reino Unido pelo formato das vias que cortam o jardim.

No projeto de organização espacial elaborado por Razgulaeff o ponto mais alto da cidade, reforçado pelo formato da elipse, ficou reservado para a Catedral. A primeira Igreja Matriz é de 1934 e foi toda construída em madeira. A segunda construção, em 1943, a elevou a primeira Catedral de Londrina, que foi demolida em 1966 para ganhar novo formato. A versão atual da Catedral e sede da Arquidiocese de Londrina é de 1972.  

Isaac Fontana (Framephoto/Estadão Conteúdo)
Isaac Fontana (Framephoto/Estadão Conteúdo)

A elipse que formaria o grão de café ainda carrega traços originais e revela 85 anos de história da cidade. Curvas e retas em que carros e pessoas atravessam sem se darem conta de estarem em uma lenda que emociona ainda que não fosse projetada para tal.  

É um jeito de contar a história, aplicando uma dose de fantasia. Há quem goste da recriação e convide para um cafezinho quem quiser ouvir o mito da formação de Londrina. Nele, há doses de ficção, sabendo que além da figura imaginária há muito para contar daquela que floresceu e rendeu frutos para além do que se enxerga no mapa.

Imaginário londrinense

Leonel Ribeiro Medeiros, 52, chega de manhã na Catedral Metropolitana de Londrina e abre as portas do coração da cidade. Há 18 anos atuando como auxiliar de manutenção no local, fica surpreso com a história do grão de café. “Eu nunca tinha ouvido falar sobre isso, mas é parecido mesmo. Acho que pode ser que tenha sido planejada assim, porque ao lado temos a Praça da Bandeira, que tem o formato da bandeira da Inglaterra. Então, eu acho que toda forma tem sua história”, revela. “Eu acredito, afinal, Londrina foi a capital mundial do café”, aponta.

A história traz curiosidade. Rodolfo Crystian Willamowius, 50, está há 25 anos na Biblioteca Pública Municipal e também não sabia sobre o assunto. “É legal a história, mas eu acho que é coincidência”, comenta. Sua análise é feita com base nas datas, a planta do projeto é de 1932, período em que a relação de Londrina com café ainda não tinha se estabelecido. “É uma lenda, assim como a da Praça da Bandeira”, aponta.

Estar todos os dias dentro do desenho do grão de café não soou como novidade para João Sampaio da Silva, 73, garçom do Hotel Bourbon. Ele chegou na cidade em 1963. “Aqui era muito diferente, a alameda era de paralelepípedo, o hotel só tinha três andares”, comenta. O garçom traça o paralelo entre a cidade e o café, mencionando que o próprio estabelecimento é uma homenagem, já que Bourbon é uma variedade do grão.

É com base nessa aproximação que ele considera a narrativa como algo que o londrinense adotou. “Acho que não foi planejado, mas acabou ficando. O café era o poder de tudo naquela época”, menciona. O garçom trabalha há 43 anos no mesmo local, experiência que lhe rendeu escuta de boas histórias da cidade, a de que Londrina tem o desenho de um grão de café no mapa seria só mais uma delas.

Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)
Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)

A forma curiosa atrai e faz a imaginação do londrinense trabalhar. Não é a figura, nem a pretensão do desenho, mas saber que de um formato nasceu uma cidade que tem a cultura do café no DNA é que faz arrancar o sorriso da coincidência ou, quem sabe, do destino.

As maravilhas ao redor

Em torno do desenho que se assemelha ao grão de café, histórias que não cabem em uma xícara. Londrina cresceu e o café ficou marcado em todas as partes. Bourbon, Catuaí, Ouro Verde, OuroBranco, variedades para o grão que agradam os mais exigentes paladares. No Centro Histórico, isso se manteve.

Gustavo Carneiro
Gustavo Carneiro

Na avenida Paraná, as negociações efervescentes e o comércio tiraram as famílias de casa para o passeio. Ali, os encontros pré e pós Cine Teatro Ouro Verde, de 1952, não deixavam a cidade esvaziar tão fácil. Difícil era perder uma sessão quando se tem o “Relojão” do Edifício América em funcionamento desde 1958. Uma espécie de Big Ben da cidade impiedoso àqueles que atrasam.  

Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)
Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)

Andar pelo centro ficou mais confortável a partir de 1977, quando foi projetado o Calçadão. Na memória afetiva do londrinense, os desenhos dos quadrados brancos e pretos em petit pavet construiu histórias individuais, alguns sentiram pela mudança de 2009, quando as pedras levaram parte da identidade para darem espaço ao novo paver atual.

Descendo em direção à avenida Benjamin Constant, a cidade conta mais história. A antiga Estação Ferroviária, 1935, deixou as portas abertas aos novos moradores o quanto pode resistir, em 1970 toda essa história passou a ser muito bem protegida e contada no Museu Histórico de Londrina.

Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)
Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)

A antiga Estação Rodoviária, de 1948, também tinha seu espaço. O prédio projetado por Vilanova Artigas foi o primeiro edifício público moderno do Paraná e o primeiro modernista tombado no interior do Brasil. Quem chegava por linha férrea ou por estrada tinha a vista da Praça Rocha Pombo para interligar as duas pontas. Em, 1989, o prédio modernista deu lugar ao Museu de Arte.

Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)
Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)

O grão em terra fértil germinou, fez caminhos e criou histórias que não se finalizam ali. Se na terra vermelha tudo floresce, o desenvolvimento é contínuo para que novas narrativas sejam criadas e, quem sabe, novas lendas.

***Zerão: Cultura, lazer e esportes no centro da cidade  

Jair Segundo

Estagiário supervisão Patrícia Maria Alves

O Centro de Recreação e Lazer Luigi Borghesi – o Zerão – é um local que reúne cultura, lazer e esportes. O espaço possui pista de cooper, academia ao ar livre, quadras poliesportivas, campo de futebol e outros atrativos. No anfiteatro Jonas Dias Martins, eventos como o FILO (Festival Internacional de Londrina) e apresentações musicais levam cultura e arte ao Zerão.  

Fabio Augusto Ito Instagram: @fabioaito (Especial para a Folha)
Fabio Augusto Ito Instagram: @fabioaito (Especial para a Folha)

Grandes nomes da música como Arrigo Barnabé, Hermeto Pascoal e Moraes Moreira já se apresentaram no palco do Jonas Dias Martins. O anfiteatro também recebe concertos do Festival Internacional de Música de Londrina e eventos esportivos. Na Copa do Mundo de 2018, a FEL (Fundação de Esportes de Londrina) montou no espaço um telão de LED para exibir jogos do Brasil.  

O Zerão foi construído no final da década de 1950, junto com o Lago Igapó, quando Londrina havia recém completado 25 anos de criação. O espaço fica na Rua Júlio Estrela Moreira, próximo ao Ginásio de Esportes Professor Darci Cortez (o Moringão).  

Ricardo Becari (Especial para a Folha)
Ricardo Becari (Especial para a Folha)

Rodoviária e sua imponência arquitetônica

PEDRO MARCONI

Reportagem local 

No coração da área urbana de Londrina, no “meio do caminho” para chegar a todas as regiões da cidade, o Terminal Rodoviário José Garcia Villar tem a sua imponência estrutural refletida na vida e história de diversas pessoas que por ele passam ou ficam. Auxiliar administrativo no terminal, Sérgio Aparecido Guerreiro viveu praticamente metade de sua vida no local.

Aos 66 anos, trabalhou no terminal que dá lugar ao museu, na rua Sergipe, sendo transferido quando a nova edificação foi inaugurada. “O terminal antigo tinha sete plataformas e já não comportava mais o movimento de passageiros. Antes não existiam os ônibus metropolitanos e todos que queriam ir para cidades da região tinham que sair daqui. A atual rodoviária tem 55 plataformas”, ressalta ele, que se aposentou, mas continua na ativa.

Apesar da cerimônia de abertura ter sido em 25 de junho de 1988, a primeira viagem oficial aconteceu dois dias depois. “O carro pertencia à empresa Birigui e tinha como destino Araçatuba, em São Paulo. Era 1h quando saiu”, detalha Sérgio Aparecido Guerra, atual encarregado de almoxarifado da rodoviária, que passou por várias funções em três décadas, como fiscal. “O primeiro Natal foi muito movimentado. As bilheterias eram no meio e ficaram lotadas”, cita. O fluxo era tanto que o terminal contava com cerca de 130 funcionários.

Um ponto turístico em si   

Característica presente até hoje, a existência de lojas e restaurantes sempre elevou a rodoviária a outro patamar, sendo também para se desfrutar. Esta essência tem origem na construção, quando o prefeito Wilson Moreira abriu oportunidade para interessados em explorar espaços, como forma de arrecadar dinheiro durante as obras.

Gustavo Carneiro
Gustavo Carneiro

“Mais de 50 lojas funcionavam: lotérica, farmácia, bomboniere, tabacaria, sorveteria. O Banestado tinha uma agência dentro da rodoviária, a companhia de polícia contava com um posto. O suco, por exemplo, funcionava, vindo do terminal velho. No entorno já era asfaltado, mas só existia a rodoviária e o estádio VGD (Vitorino Gonçalves Dias)”, contam. São oito lojas existentes atualmente.

Num território que convive com o progresso, o terminal rodoviário, antes de sua concepção, deu lugar à Vila Matos, conhecida por ser a zona da meretrícia de Londrina. A “fama” era motivo de escândalo para muitas famílias, que cobravam polícia e poder público por medidas drásticas. Por conta desta situação, a vila era vista como um problema, onde moravam famílias pobres e prostitutas.

O projeto de arquitetura do melhor do Brasil

A ideia de construir a estação foi a solução de urbanização encontrada para dar novo status à região pelo então prefeito, Antonio Belinati. Para uma obra marcante, o contratado para o projeto arquitetônico foi Oscar Niemeyer, que já figurava como maior nome da arquitetura brasileira. A construção foi iniciada no final da década de 1970, porém, parou por falta de dinheiro.

Acervo Oscar Niemeyer
Acervo Oscar Niemeyer

A retomada ocorreu anos mais tarde, já na década de 1980, na administração de Wilson Moreira, eleito para mandato de seis anos. “O prefeito me chamou na sala dele e pediu que estudasse uma forma de terminar a construção. Tinham sidos feitos fundação e muro de arrimo. A obra era muito cara, o projeto previa cobertura em concreto armado. Era muito dinheiro para uma cidade do interior”, relembra Junker Grassiotto, secretário de Obras na época, se referindo a um município onde habitavam pouco mais de 301 mil pessoas.

Com a possibilidade de alterar o projeto, teve o aval do chefe do executivo para procurar Niemeyer, no Rio de Janeiro, com o objetivo de pedir o necessário para baratear a edificação. “Fui ao escritório dele e falei que precisávamos mudar e que queríamos contratá-lo novamente. Tinha um valor liberado e ele falou menos. Fechamos o negócio, com a estrutura metálica definida”, destaca.

Arquivo Rodoviária de Londrina
Arquivo Rodoviária de Londrina

O esboço inicial era para uma cúpula com formato de rosácea e um mirante onde fica a caixa d’água, que, segundo o ex-secretário, quase foi esquecida. “Depois de o projeto ser alterado vimos que faltava a caixa d’água. Voltei ao Rio de Janeiro e o Oscar Niemeyer pegou um pedaço de papel e resolveu em um minuto. Para mim essa é uma das grandes obras dele”, cita. Na parte interna, o arquiteto Júlio Ribeiro promoveu otimizações.

Gustavo Carneiro
Gustavo Carneiro

Uma vida de idas e vindas

Com circulação de mais de dois milhões de pessoas anualmente, o terminal rodoviário se tornou uma parte essencial de Londrina e seus moradores. “Com o ‘suor’ do meu trabalho na rodoviária consegui a casa própria, criar meus filhos e isso é uma grande vitória. Este lugar tem importância para mim e defendo até o fim. É uma vida aqui dentro”, emociona-se o auxiliar administrativo Claudemir Eira, que demonstra que diferente do tempo, o amor não é passageiro.

***Aeroporto: Um ícone na zona leste

Jair Segundo

Estagiário supervisão Patrícia Maria Alves

O Aeroporto Governador José Richa é um dos pontos de referência da zona leste de Londrina. Construído no local onde funciona até hoje em 1949, em 1958 o aeroporto ganhou uma estação de passageiros, inaugurada pelo então prefeito Antônio Fernandes Sobrinho. Mais tarde, foi batizado com o nome de Governador José Richa em homenagem ao 47º governador do Paraná, o primeiro a ser eleito após o fim do regime militar no Brasil.

Marcos Zanutto (Arquivo Folha)
Marcos Zanutto (Arquivo Folha)

No final da década de 1950 e início dos anos 1960, o aeroporto de Londrina testemunhou o desenvolvimento econômico da cidade. Muitos empresários de São Paulo vinham à cidade devido ao café. Na época, o aeroporto de Londrina tornou-se o terceiro mais movimentado do país. Hoje, o aeroporto Governador José Richa é o terceiro maior do estado e o quarto da região sul do Brasil. Diariamente, quase três mil passageiros transitam pelo aeroporto de Londrina, em mais de 70 voos.

Londrina de sonoridades, concretudes e urbanidades

Por Célia Musilli

FOTO CAPA POEMA - Fabio Augusto Ito Instagram: @fabioaito (Especial para a Folha)
FOTO CAPA POEMA – Fabio Augusto Ito Instagram: @fabioaito (Especial para a Folha)

No começo era a mata, mas vieram as máquinas. Era a Pequena Londres se transformando na Grande Londrina. No começo eram os córregos que viriam a se chamar Igapó – espelho d’água. Cartão-postal da confluência de riachos e da confluência humana. Era a Pequena Londres se transformando na Grande Londrina. Aos poucos chegaram outros voos, mais altos que o do sabiá, mais velozes que o do curió. Ronco de motor, a leveza inusitada do ferro. Aviões que descem e decolam com a intimidade de quem conhece a cidade do alto. Vista aérea, vista etérea. Era a Pequena Londres se transformando na Grande Londrina. Vieram as avenidas onde havia poeira, vieram as estradas onde havia sertão. Era a Pequena Londres se transformando na Grande Londrina.

Foram-se as vendas, vieram os supermercados. Foi-se a rodoviária de Artigas, que hoje abriga a arte, veio a outra com desenho de disco voador. Criatividade circular na cidade das rodas e das rotas.

Ônibus cruzando o estado e amanhecendo como jovens insones num projeto de futuro. Era a Pequena Londres se transformando na Grande Londrina, cidade universitária.

De bairros acanhados a bairros planejados, das construções de madeira a uma das cidades mais verticais do País, a urbe ousa, cria cenários e barulhos estranhos.

Aos 85 anos, uma verdadeira mistura. Sotaque paulista e culinária da China. Chucrute e sushi nos pratos. Feiras agropecuárias e festas nipônicas na primavera. Caldeirão que ferve na Sergipe e se acalma aos domingos nos shoppings.

A Grande Londrina acorda cidade, mas sonha como metrópole.

No fundo, o cochicho das águas embala um longo leito humano. Rumo aos 100 anos, quase 600 mil habitantes.

Londrina de sonoridades, concretudes e urbanidades.

UEL como porta de entrada

PEDRO MORAES

Reportagem local 

A terra vermelha foi o primeiro atrativo. O solo produtivo em abundância ofertado pela Companhia Melhoramentos Norte do Paraná seduziu pessoas de todo o País – em maioria paulistas, gaúchos e mineiros – sem contar os italianos, os japoneses e os alemães. A multiplicidade de culturas e sotaques fez de Londrina uma cidade de imigrantes. Passadas as décadas, a cidade permanece recebendo remessas de forasteiros, mas o interesse é outro: a educação. Ao longo dos seus 48 anos de existência, a UEL (Universidade Estadual de Londrina) exerce um papel fundamental para o desenvolvimento não só da cidade, como de toda a região. Os atrativos são a qualidade do ensino, as linhas de pesquisa e o serviço prestado para a sociedade. “A qualidade e as bases sólidas dos cursos de graduação e pós-graduação são um grande atrativo para quem vem de fora e acaba ficando na cidade”, opina a diretora de Avaliação e Informação institucional da UEL, Elisa Tanaka.

Gustavo Carneiro
Gustavo Carneiro

Historicamente, o número de estudantes egressos de outros estados varia razoavelmente, mas nunca foi irrelevante. Os números provam a abrangência do interesse pela universidade. Dos 13.339 alunos atualmente matriculados na graduação, 20,62% não são do Paraná. Nessa estatística, os londrinenses são maioria num total de 7.030 estudantes. Segundo dados elaborados pela UEL, desde 1995 os estados de São Paulo, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul foram os que mais encaminharam alunos para a instituição. Já entre os estrangeiros, os paraguaios, os cabo-verdianos, os angolanos e os japoneses foram os que mais ocuparam as salas de aula dos cursos de graduação. “A UEL cresceu com Londrina e foi criando estruturas para viabilizar a vida dos alunos. É a única que oferece moradia aos estudantes no estado, oferece restaurante, acolhimento. É uma característica de uma cidade de imigrantes”, afirma Tanaka.

Um intercâmbio de vivências

As histórias de todos esses estrangeiros que vieram em busca de uma carreira se misturam com a da própria cidade e da UEL. São incontáveis os casos daqueles que permaneceram e até continuam com vínculos com a universidade. É o caso da própria professora Elisa Tanaka, filha do professor Mitsuo Tanaka, um dos fundadores do curso de Odontologia, que acabou seguindo os passos do pai. Foi aluna da graduação, retornou como professora e hoje trabalha no comando da instituição. “Sou filha de um imigrante japonês, que precisou abrir mão na cidadania dele para servir à UEL. A família dele veio para o Brasil para trabalhar na lavoura do café, sofreu com as dificuldades da guerra, mas ele decidiu estudar e se tornou professor. A minha história é a mesma de tantos outros”, lembra.

O intercâmbio de experiências dos estudantes e professores de diferentes origens acabou se tornando um motivo de integração na comunidade acadêmica. As ideias recém-chegados de grandes centros como São Paulo ajudavam a enriquecer a discussão cultural e política da cidade em plena Ditadura Militar, enquanto a informação não chegava em profusão através da internet.

Gustavo Carneiro
Gustavo Carneiro

“A convivência sempre foi muito rica. Lembro que havia um colega que nunca tinha visto uma vaca de perto. Aqui foi a primeira vez. Mas também essas pessoas que vieram de fora ajudaram a difundir o nome de Londrina e da UEL em todo o mundo”, opina o médico sanitarista Gilberto Martin, coordenador geral da associação Alumni-UEL, criada com o objetivo de congregar os ex-alunos da universidade.

Amor forasteiro que fixa raízes

As portas abertas, tanto de Londrina como da UEL, permitiram o próprio desenvolvimento da cidade e da instituição. “A presença dessas pessoas de foram deram retorno e ajudaram a formar uma inteligência local. O desenvolvimento de pesquisas e dos profissionais contribui para a vida dos londrinenses. Quantos estudantes vêm de fora, se formam médicos e permanecem aqui atendendo?”, lembra Martin.

Gustavo Carneiro
Gustavo Carneiro

À frente da associação de ex-alunos, o médico atua para localizar profissionais formados pela UEL em todo o mundo. O trabalho pretende não só divulgar o que eles produziram, como trabalhar na formação de uma fundação que possa dar apoio financeiro para a universidade, além de divulgar e promover ainda novos contatos globais. Um ciclo que pode valorizar ainda mais a UEL, Londrina e continuar atraindo novos interessados, assim como na época que tudo não passava de terra vermelha.

Arquivo Museu do LEC
Arquivo Museu do LEC

Um estádio no meio dos cafezais

SIMONI SARIS

Reportagem local 

No início de 1976, o LEC (Londrina Esporte Clube) vivia uma fase de glória no futebol. O clube se preparava para disputar o Campeonato Nacional, que reunia a elite do futebol brasileiro, e o município sentiu a necessidade de construir uma praça esportiva à altura das conquistas do time. José Carlos Abraão era secretário de Administração do então prefeito José Richa e contou ao filho, Eduardo Felipe Abrahão, com 14 anos, sobre o projeto de execução do Estádio do Café. “Eu ia sempre ao VGD, desde pequenininho. Quando soube da construção do estádio, vim a pé desde o (jardim) Shangri-La (zona oeste). Estavam aterrando isso aqui. Fiquei maravilhado. Nunca tinha entrado em um estádio desse tamanho e eles colocando os tijolos”, recordou Eduardo, hoje administrador do estádio.  

O terreno foi desapropriado pelo município e ao redor, havia apenas cafezais. A avenida Henrique Mansano era uma pista simples, sem asfalto. A obra custou 28 milhões de cruzeiros e o orçamento era restrito. Registros históricos dão conta de que para terminar dentro do prazo de seis meses, a prefeitura convocou a população, que trabalhou na obra de forma voluntária. Muitos operários saíam do serviço no fim do dia e cumpriam um terceiro turno, na construção do Café, à noite.  

Foi a falta de caixa também que levou o prefeito a cobrar de cada secretário seu a aquisição de uma cadeira cativa. “Meu pai não podia comprar. Custava muito dinheiro. Ele fez um papagaio (financiamento) no Banestado e comprou. Todo secretário acabou comprando”, contou Eduardo.  

Ricardo Becari
Ricardo Becari

Uma ferradura para dar sorte ao time

A maior praça esportiva do interior do Paraná foi edificada em um terreno elevado no Parque Ouro Verde (zona norte). Quem fica na parte mais alta da arquibancada tem uma bela vista da cidade. Pelo projeto original, o espaço destinado ao público deveria cercar todo o gramado, mas a obra nunca se completou e a construção acabou ficando em formato de ferradura, com a abertura voltada para a zona sul.  

A emoção do torcedor

O estádio foi inaugurado em 22 de agosto de 1976, um domingo de muito sol e calor, e o Londrina enfrentava o Flamengo em um amistoso. Foram mais de 40 mil pagantes, mas o público total passou de 55 mil pessoas. “Era muito grande o estádio. O número de habitantes de Londrina não chegava a 200 mil”, comparou Eduardo. “Foi maravilhoso o jogo de estreia.”  

Há 30 anos, Edson Henrique dos Santos, 67, é funcionário do Londrina. Atualmente é administrador de Futebol do clube e, em 2016, quando foi criado o Museu do LEC, fizeram a ele uma homenagem. O espaço foi batizado com seu nome. Mas 43 anos atrás, Santos era só um torcedor do Tubarão. “Onde o Londrina ia, eu estava atrás, desde 1970. Em 1976, o Londrina estava no auge.”  

Isaac Fontana (Framephoto/Estadão Conteúdo)
Isaac Fontana (Framephoto/Estadão Conteúdo)

A notícia da construção do estádio, recorda, correu rápido pela cidade e todo mundo queria ver de perto a obra. “Fiquei entusiasmado com a ideia. Todos os dias a gente estava lá, acompanhando as máquinas trabalhando. O Wilson Moreira era o secretário municipal de Obras e fez de tudo para que acontecesse.”

Apesar da construção a toque de caixa, o estádio foi inaugurado ainda inacabado. Uma foto guardada por Santos do dia da estreia mostra as cadeiras cativas sem cobertura. “Mas tinha quase 50 mil pessoas. Até nos barrancos foi colocado gente. Foi uma emoção muito grande entrar naquele estádio, uma satisfação imensa, ver aquele formigueiro de gente. Hoje já não pode. Hoje, o limite são 32 mil pessoas.”

Como torcedor assíduo, Santos não perdeu nenhum jogo após a inauguração do estádio. No dia 22 de agosto estava lá, no amistoso contra o Flamengo. E na quarta-feira seguinte, no dia 25, também marcou presença no segundo amistoso, entre o Londrina e o Corinthians, uma partida noturna para estrear os refletores.  

Um jogo para ficar na memória

O placar do jogo de estreia fechou em 1 a 1. No campo, os craques Zico e Júnior defendiam a camisa rubro-negra. Na equipe alviceleste, estavam o meia-direita Carlos Alberto Garcia e o ponta-esquerda Ademir de Barros, o Paraná, autor do primeiro gol no estádio, convertido em uma cobrança de pênalti. A penalidade foi anotada pelo juiz quando Garcia sofreu uma falta grave ao tentar driblar o lateral-esquerda Júnior. Ele se preparava para cobrar o pênalti, mas foi interrompido por Paraná. “Naquela época, ganhava uma televisão quem fizesse o primeiro gol e televisão ninguém tinha. Aí ele bateu”, recorda Garcia. Paraná entrou para a história como autor do primeiro gol da partida e do Café.  

A trajetória profissional de Garcia, 65, se confunde com a história do Estádio do Café. E ele ainda se emociona ao entrar na arena e lembrar de seu desempenho. “Fazer gol era muito legal. Acho que estou ouvindo agora (o barulho da torcida). Por muito tempo eu acordava assustado, sonhando com isso, mas agora passou.”

Paraná, 77, vive atualmente em Sorocaba (SP). Em 1976 integrava o plantel do LEC quando em uma roda de conversa, em um posto de combustível, ouviu dizer que iriam construir um estádio. “Fomos ver o terreno. Era meio deserta a região. Todo mundo ia lá ver. O pessoal trabalhava dia e noite na construção.”

Confrontando a história de Garcia, ele conta que na inauguração seu único objetivo era jogar. “Eu nem sabia que tinha um monte de prêmio para quem fizesse o primeiro gol. O Carlos Alberto pegou a bola e eu não o deixei bater, eu era o batedor oficial de pênalti. Entrei para marcar o Zico, joguei bem e ainda fiz gol. E ganhei todos os prêmios.”  

***Saul Elkind: Conexão da zona norte   

Jair Segundo

Estagiário supervisão Patrícia Maria Alves

A avenida Saul Elkind é uma das principais vias da zona norte de Londrina. Criada em 1981, a avenida leva o nome do pai de David Elkind, que foi diretor do DNER (Departamento Nacional de Estradas de Rodagem) e, na época, foi responsável por criar o entorno urbano do atual Terminal Rodoviário. Ao invés de dar seu próprio nome à via, David preferiu homenagear o pai, Saul Elkind, que chegou no Brasil em 1919. O fato curioso é que o ucraniano nunca esteve em Londrina.  

Ricardo Becari
Ricardo Becari

Mas a avenida Saul Elkind está presente no dia a dia de milhares de londrinenses, por abrigar posto de saúde, hospital, shopping e outros pontos comerciais. Aos domingos, a via recebe movimento especial devido à Feira do Cincão. Lá é possível encontrar as tradicionais frutas, hortaliças e legumes de todas as feiras. As barraquinhas de pastel, de utensílios domésticos e de diversos serviços que podem ser encontrados na Feira do Cincão também atraem a clientela, que usam a feira como ponto de encontro.  

Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)
Odil Miranda Ribeiro (Especial para a Folha)

Domingo com gostinho de amizade

Por Jair Segundo

Mal fizemos a digestão do atrasado almoço de domingo, quando os preparativos começaram. Pegamos a cesta de piquenique e a enchemos com frutas, doces, sucos e aperitivos. Demos tchau para o meu cãozinho Dudu, porque lá ele não poderia entrar, e entramos no carro rumo ao Jardim Botânico de Londrina. A estrada que nos leva ao nosso destino favorito nos fins de semana é plana e o vento feito pelos carros balança as plantações que cercam a via.  

A primeira parada é ainda antes de entrar no Jardim Botânico. Nosso caldo de cana aos domingos já é tradição! Gostamos de tomar enquanto observamos os skatistas praticando manobras na pista em frente ao parque. Ao entrar, descemos as escadarias, cruzamos a ponte de madeira e vamos para o lugar de sempre, próximo à estufa. Parece que a grama amassada já marca o local onde estendemos nosso lençol para o último piquenique e reclamamos do calor.  

Da última vez, assistimos de longe um casal de noivos que fazia um ensaio fotográfico nos gramados do Jardim Botânico. Agora, mãe, pai e filho registram momentos antes do bebê completar um ano de idade. Sempre gostamos de observar como as pessoas interagem com o espaço. Imagino esse bebê voltando ao botânico anos depois e reparando quanto o local mudou desde as fotos que tirou no seu primeiro ano de vida. Ou então o casal de noivos mostrando aos seus filhos o exato lugar onde eles tiraram as fotos anos antes. O Jardim Botânico vai ficar registrado na vida dessas pessoas e sempre vai remetê-los a alguma lembrança.  

Ilustrações: Odil Miranda Ribeiro @odilmirandaribeiro (Especial para a Folha)
Ilustrações: Odil Miranda Ribeiro @odilmirandaribeiro (Especial para a Folha)

ILUSTRAÇÕES

ODIL MIRANDA RIBEIRO 

@odilmirandaribeiro

SOBRE O ARTISTA

Mestre em Comunicação e Linguagens pela Universidade Tuiuti do Paraná, Odil Miranda Ribeiro é graduado em Artes, curso Superior de Pintura da Escola de Música e Belas Artes do Paraná, PR. Entre 2007 e 2009 frequentou o curso de pintura no ateliê de Felipe Scandelari. Em 2009, no México, frequentou o ateliê de pintura na “Casa de La Cultura Jesús Reyes Heroles”, sob orientação do “Maestro Pedro Hernandez”. De 2014 à 2015 foi 3º Conselheiro da Sociedade de Amigos do Museu de Arte Contemporânea do Paraná. – MAC Curitiba. Nascido em São Paulo, mora em Londrina.

Da mesma forma que ele me lembra das minhas amizades que se fortaleceram naqueles gramados. Das longas conversas existenciais – que às vezes nem faziam tanto sentido assim – enquanto percorríamos as trilhas em meio à mata. Das vezes que jogamos truco à beira do laguinho valendo o último pedaço de bolo. Das fotos que tiramos sentados nas pedras e demos risada porque ficaram parecendo fotos de “capa de disco”. O Botânico mantém viva a memória desses momentos que, para mim, são tão bonitos quanto a beleza natural do parque.  

O local pode mudar, as amizades também, mas ele sempre vai guardar essas histórias e me despertar o sentimento de gratidão. Gratidão por ter sido solo fértil para germinar laços que, mesmo que se rompam algum dia, podem sempre encontrar sua origem de volta naquele espaço. Amizades não cabem em uma cesta, mas têm o tamanho certo para criar histórias, compartilhar momentos e deixar a vida com gostinho de piquenique aos domingos no Jardim Botânico.

Talita Galindo - Especial para a Folha
Talita Galindo – Especial para a Folha

Protagonismo na “era do concreto”

VÍTOR STRUCK

Reportagem local 

“Se você me perguntar se eu faria isso de novo eu diria que não faria porque foi muita ‘poesia’. É romântico e megalomaníaco”. O desabafo é de um médico cuja alma é de engenheiro. José Isper, 73, se refere ao edifício de 16 andares em que mora com a esposa Mônica há mais de 27 anos e cuja área útil de cada apartamento possui nada menos do que 500 metros quadrados. Um sonho de concreto que começou a se tornar realidade em dezembro de 1986 a partir da vontade dele e de outras 11 famílias assessoradas por um arquiteto que podem ser considerados pioneiros do bairro que hoje possui 110 condomínios e cerca de 45 mil moradores.

Odil Miranda Ribeiro
Odil Miranda Ribeiro

Contar a história da Gleba Palhano seria uma tarefa pouco prazerosa sem a ajuda do casal. Ela, empreendedora do ramo da moda e de família italiana, não fica atrás do marido no quesito “inventividade” ao ter arquitetado junto com ele o sétimo endereço do casal, no número 460 da rua Caracas. Para ela, tudo havia ficado perfeito. Salas, quartos, cozinha e sacada grande. Cada parede no devido lugar, o que os permitiu desfrutar do espaço sem nem considerar a possibilidade de mudança ao longo dos anos. “Eu faço questão de dizer, é um belíssimo apartamento, nunca tivemos problemas sérios e, com o dinheiro desse você não compra aquele lá e esse aqui é melhor que aquele lá”, orgulha-se.

Arquivo pessoal José Isper
Arquivo pessoal José Isper

Já ele é de origem síria e veio de Presidente Prudente na segunda metade da década de 1960 para aportar na primeira turma de Medicina da UEL (Universidade Estadual de Londrina). “Cada um com as suas ‘manias’. Isso aqui a ideia foi minha. Eu falei ‘ó, tem que ter uma sacada que caiba uma mesa, cadeiras’. Recebemos as pessoas aqui”, conta sem titubear o “ditador” do grupo que projetou o Chácara Bela Vista, o primeiro a ser erguido na propriedade que havia sido dos irmãos Palhano, entre o distrito Espírito Santo e o lago Igapó.

Mas o adjetivo que escolhera para representar o quanto o próprio protagonismo à frente da planta do prédio havia sido importante uma vez que já tinha no currículo três edificações é um exagero se comparado com a versão da esposa ao ser questionada sobre a relação entre os poucos e solitários vizinhos do Bela Vista. “Aqui era andar de pijama para cima e para baixo, era uma família”, conta. “Como nós que tocamos a obra as reuniões eram muito frequentes, as decisões eram feitas em conjunto, virou uma grande família”, ri.

À época, as avenidas Maringá e Madre Leônia Milito ainda não haviam sido pavimentadas, e o Shopping Catuaí, “farol” econômico do novo bairro, ainda estava nos projetos da Construtora Khouri.

Fotos arquivo pessoal (cima)/ Patrícia Maria Alves (baixo) 
Fotos arquivo pessoal (cima)/ Patrícia Maria Alves (baixo) 

Das chácaras aos arranhacéus

Até meados de 1970, reta final da era do café, o município possuía 36 edifícios com mais de três pavimentos. Outros 139 ainda teriam sido construídos sob o otimismo econômico que o País atravessava na década de 80. Também segundo o estudo “Verticalização em Londrina” (2006), a cidade teria ganhado 947 prédios entre 1980 e 1990, e havia forte interesse de alguns moradores, como Isper, em atuarem como agentes modeladores do espaço urbano.

Arquivo pessoal José Isper
Arquivo pessoal José Isper

Nos primeiros anos na propriedade de 750 alqueires que Mábio Gonçalves Palhano se despediu aos 88, o silêncio da madrugada só era quebrado pela “latição” da cachorrada da vizinhança de chácaras. “Teve gente que sentiu demais a diferença”, lembra o médico ao citar que os pássaros se encarregavam de quebrar a mudez da manhã e os bois, a da tarde. “Era uma fazenda”, ri.

Patrícia Maria Alves
Patrícia Maria Alves

Mas a terna lembrança sobre a paisagem sonora não é tão agradável na memória da esposa, especialmente quando da chegada de uma nova “toada”, ainda na década de 1990. “Teve uma fase complicada, era um canteiro de obras. Por uns dez anos ficamos só com muita poeira, muito barro, bagunça de prédio”, lembra a pioneira.

O espírito do tempo

Aproveito a amizade entre Isper e o apreço do amigo Domingos Pellegrini sobre a expressão alemã que representa “espírito do tempo” para perguntar se a Gleba Palhano é o local que melhor representa o “Zeitgeist” da Londrina das últimas décadas. Não houve como discordar.

Arquivo pessoal José Isper
Arquivo pessoal José Isper

“Olha Londrina teve a fase do café, tem as histórias que vinha avião com prostitutas, tanta gente milionária e tal. Ai depois do café, a Geada Negra, o que manteve um nível de padrão aqui foi a Universidade, a cidade começou a virar universitária, a mudar de estilo. Ai a gente podia, talvez, colocar isso como uma nova era, tanto a Palhano quanto a região sul. É a ‘era do concreto’, aí um nome bonito”, ri.

José Isper (especial para Folha)
José Isper (especial para Folha)

Ao mesmo tempo a constatação trouxe à tona uma ambiguidade geralmente inata ao sucesso do capitalismo imobiliário materializado na segregação residencial e no novo estilo de vida por aqui. E que, segundo a avaliação dele, vale também para quem viu seu patrimônio se multiplicar centenas de vezes.

“Você já passou na Ayrton Senna em horário de pico”, questiona. E completa. “Gostaria que o ímpeto da ganância diminuísse um pouco, que usassem um pouco mais de inteligência coletiva. Mas aí é aquilo, os terrenos foram tomando dimensões econômicas e financeiras que daí cada metro quadrado ‘o cara’ não quer deixar, quer transformar aquilo em ouro”, lamenta.     

Orgulho desta terra

MICAELA ORIKASA

Reportagem local 

Do alto é possível ver uma Londrina que funde o vermelho de sua identidade rural com o cinza do fenômeno de urbanização. Em poucos mais de oito décadas, a cidade se tornou um território rico em etnias, negócios e serviços, cultura e conhecimento. E uma indispensável comemoração nestes 85 anos é a aptidão que Londrina tem para inventar, inovar e buscar soluções em diferentes áreas. No campo, um dos personagens principais dessa história é o Iapar (Instituto Agronômico do Paraná). Afinal de contas, são 47 anos projetando Londrina afora.

Arquivo IAPAR
Arquivo IAPAR

Para o diretor de Pesquisa Rafael Fuentes LLanillo, o Iapar tem a conotação do espírito pioneiro da cidade. “Londrina foi criada no ciclo do café e já naquela época viu-se a necessidade de estudar novas atividades econômicas ligadas à agricultura, pois já se sabia que o ciclo do ‘ouro verde’ estava se esgotando”, conta. Com os pés na terra e a cabeça no futuro, lideranças começaram a se articular para criar um órgão de pesquisa e em 1972, o Iapar ganhou corpo se tornando a primeira instituição pública do Paraná com sede no interior. A ‘fazenda’ do Iapar ocupa um terreno de 245 hectares na zona sul, com testada para a PR-445. Parte dessa estrutura envolve uma área do Jardim Botânico, pois como lembra o agrônomo Florindo Dalberto, 75, a presença da rodovia e de mata preservada eram prioridades para a implantação do órgão.

Dalberto foi um dos membros da comissão instituída para a escolha desse local. “Surgiram ofertas como a fazenda Alvasa que pertencia ao conhecido médico Raul Lessa, mas acabou-se negociando vários lotes de pequenos proprietários, pagos com preço de mercado e recursos do IBC. Era um projeto que empolgava a cidade e por isso, ninguém colocou obstáculos. Muito pelo contrário. Tal empolgação facilitou as negociações. O Iapar se tornou em luz brilhante na constelação de pesquisa no Brasil todo”, conta, com orgulho.

Patrícia Maria Alves
Patrícia Maria Alves

De cima, o retrato da fazenda do Iapar ilustra toda uma diversidade. Desde os extensos gramados, ao capricho na jardinagem, a estação meteorológica, laboratórios e claro, os cultivos das mais diversas culturas. Além da sede em Londrina, o órgão possui cinco polos regionais de pesquisa (Curitiba, Ponta Grossa, Paranavaí, Pato Branco e Santa Tereza do Oeste) e 20 fazendas experimentais.

Do solo à laranja

Patrícia Sagae
Patrícia Sagae

O café e os grãos como feijão, soja e milho continuam sendo uma das forças do instituto, através do lançamento de novas variedades, pesquisas sobre controles de pragas e doenças, melhoramento genético e manejo do solo. Vale lembrar que a Embrapa Soja foi criada a partir de um programa de pesquisa em soja do Iapar.

Patrícia Maria Alves
Patrícia Maria Alves

“Todas as culturas baseadas em preparo de solo convencional geraram um processo erosivo enorme no início dos anos 70 e veio do Iapar o aperfeiçoamento do sistema de plantio direto. Temos ajudado diversos países a desenvolver esse sistema chamado mundialmente de agricultura conservacionista”, destacou o diretor Fuentes.

Mas é substancial falar das pesquisas em citricultura. No final dos anos 70, a doença do ‘cancro cítrico’, que é disseminada pela chuva e vento, resultou na proibição do plantio de laranja em pelo menos 199 municípios paranaenses e o Iapar em Londrina, a partir de muitas pesquisas, conseguiu viabilizar uma cadeira produtiva inteira em todo o País.

Hoje, o Brasil é o maior produtor de laranja do mundo e o Estado ocupa a terceira posição, atrás de São Paulo e Minas Gerais. “A citricultura do Paraná só é possível por causa do trabalho que se estabeleceu aqui no Iapar de estudar o processo de tolerância das plantas ao cancro cítrico”, destaca Fuentes.

Um dos pesquisadores contratados em 1979 para encarar esse desafio foi Rui Pereira Leite. “Selecionamos variedades mais resistentes, desenvolvemos formas de proteção com utilização de quebra-ventos e aplicações de produtos à base de cobre. No final da década de 80, cooperativas se interessaram gerando o desenvolvimento da citricultura no Estado. De 4 mil hectares de citros passamos a 36 mil e levou também à implantação de indústrias de sucos. Ou seja, criou-se um setor da economia a partir daqui de Londrina porque as mesmas medidas foram adotadas em outros estados e países”, afirma.

Patrícia Maria Alves
Patrícia Maria Alves

Mas os desafios nessa área não param. Leite cita a dedicação aos trabalhos de citros orgânicos e de combate a outro inimigo: o HLB (Huanglongbing), doença causada por uma bactéria transmitida por um inseto.

A pesquisadora Ana Maria Menegin está à frente de um grupo que trabalha no controle biológico da praga, utilizando a técnica de multiplicação do inseto Tamarixia radiata. “É um inimigo natural. Por mês, conseguimos desenvolver cerca de 100 mil insetos que são coletados um a um e soltos na região de Londrina e no noroeste do Estado”, resume. A iniciativa é uma parceria do Iapar com cooperativas e indústrias de citros.

Bons ventos para o futuro

Fuentes lembra que o Iapar teve um importante papel na recondução da atividade econômica do Estado. Os primeiros 25 anos são citados por ele como anos de glória, com protagonismo completo e expansão no quadro de pesquisadores.

Patrícia Maria Alves
Patrícia Maria Alves

“O Iapar não pode ser mais o ‘faz tudo’ das décadas anteriores. Está sendo proposta uma fusão das organizações estatais que lidam com agricultura no Estado e provavelmente, vamos passar a viver dentro de um outro corpo institucional. Temos que nos redescobrir e nos reinventar dentro da nossa função, mas o Iapar sempre será um orgulho para os londrinenses porque mesmo dentro desse ‘novo corpo’, a sede da pesquisa agropecuária estadual vai continuar sendo aqui”, conclui.

***Embrapa: Londrina é agro   

Jair Segundo

Estagiário supervisão Patrícia Maria Alves

Londrina é sede de uma das 43 unidades da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária). A Embrapa Soja foi fundada na cidade em 1975 e atua no desenvolvimento de soluções tecnológicas para a cultura da soja, do girassol e do trigo. Localizada no distrito da Warta, em uma fazenda de 350 hectares, a sede possui laboratórios, restaurantes, biblioteca e auditórios. A unidade recebe visitas de estudantes, agricultores, parlamentares e lideranças do agronegócio de países da América Latina e da Europa.  

O trabalho da Embrapa Soja impacta tanto a renda do produtor rural, quanto a qualidade dos alimentos que chegam à mesa da população. A unidade desenvolveu cultivares que pudessem ser plantadas em regiões tropicais, de baixa latitude. Isso permitiu levar a cultura da soja para estados como Goiânia, Tocantins, Mato Grosso e Bahia, sendo essa uma das grandes contribuições da Embrapa Soja à agricultura nacional e a que a fez se tornar referência mundial em pesquisa para a cultura da soja em regiões tropicais.  

Isaac Fontana (Framephoto/Estadão Conteúdo)
Isaac Fontana (Framephoto/Estadão Conteúdo)

Expediente

85 ANOS

LONDRINA E SUAS MARAVILHAS VISTAS DE CIMA

DATA DE PUBLICAÇÃO 10 de Dezembro de 2019

TEXTOS E PESQUISA  Guilherme Marconi, Jair Segundo, Laís Taine, Micaela Orikasa, Pedro Marconi, Pedro Moraes, Vitor Struck, Simoni Saris;

IMAGENS Gustavo Carneiro, Isaac Fontana, Jair Segundo, Patrícia Maria Alves, Arquivo Folha, Arquivo Museu Histórico de Londrina, Arquivo IAPAR, Arquivo Museu Edson Henrique dos Santos;

PARTICIPAÇÃO ESPECIAL Fabio Augusto Ito, Talita Galindo, Odil Miranda Ribeiro;

IMAGENS AÉREAS: Ricardo Becari;

ILUSTRAÇÕES Odil Miranda Ribeiro, Patrícia Sagai;

DIAGRAMAÇÃO (Impresso) Anderson Mazzeo, Gustavo Andrade, Luciano Silva, Gilberto Anchieta Soares; (Web) Patrícia Maria Alves;

PRODUÇÃO/EDIÇÃO Celso Felizardo, Fernando Faro, Lucília Okamura, Patrícia Maria Alves;

APOIO LOGÍSTICO Jenes de Almeida;

SUPERVISÃO DE PROJETO Adriana De Cunto (Chefe de Redação)